A história de crises financeiras no Brasil vem de longe. Já nos primeiros anos da nossa República, mal os monarcas tinham apeado do trono, enfrentávamos uma bolha econômica, no caso, uma bolha de crédito que ficou conhecida como a Crise do Encilhamento.
Ela estourou durante o governo provisório de Deodoro da Fonseca (1889-1892). Ruy Barbosa queria estimular a industrialização do Brasil. Então, se você era empreendedor e garantia que ia criar uma empresa, uma indústria, o dinheiro estava liberado de antemão. O crédito estava livre e, pra isso, tudo o que o governo fazia era imprimir mais dinheiro.
Qualquer um que saiba um pouquinho de economia sabe que isso não é das coisas a mais inteligente (embora Ruy Barbosa fosse conhecido como a Águia de Haia).
Imprimir dinheiro gera inflação, de um modo geral. Por outro lado, se tinha tanto papel-moeda disponível, começou uma grande especulação econômica. Lançamento de ações sem lastro, por outro lado, foi o modo de o mercado aproveitar a onda e “imprimir seu próprio dinheiro”. O que as empresas faziam depois disso? Faziam ofertas públicas de aquisição, visando o fechamento do capital.
O termo Crise do Encilhamento veio do ditado que diz que “cavalo encilhado não passa duas vezes”: os empresários de então – e desencadeadores da crise – viram todo o contexto como uma oportunidade de enriquecer fácil.
Com a Crise do Encilhamento, diversas empresas fecharam. Houve sonegação fiscal e diversas companhias que deveriam ter sido abertas com o crédito fornecido – e não abriram de verdade – vendiam suas ações. Imagine só, comprar ações de empresas fantasmas!
Essa má fé, agravada pela benção da lei bancária de então, permitia que os “empresários” agissem sem vigilância ou punição oficial. O lançamento de títulos ou ações virou um buraco sem fundo: as empresas criadas não tinham fundamentos e usavam o lançamento de papeis como uma forma de obter recursos. E, se o investidor não se subscrevesse, perdia os direitos sobre os títulos que havia adquirido anteriormente.
Sem mercado secundário, o valor dos papéis era amarrado aos seus valores nominais e não oscilava segundo as leis da oferta e da procura que tão bem conhecemos hoje. Com o mercado de balcão congestionado, a negociação de novos títulos encalhou e o lançamento de empresas legítimas foi inviabilizado, prejudicando investidores destas e daquelas.
Ruy Barbosa, com seu belo plano, provocou um grande colapso econômico e um surto inflacionário singular.
Para completar o cenário, o default dos títulos da dívida argentina e o colapso do Banco Baring Brothers, a partir de setembro de 1890, provocaram o evento conhecido como o “Pânico de 1890”.
Finalmente, em 1891 houve grande confusão em torno das debêntures da Companhia Geral das Estradas de Ferro. A grande procura por esses papeis, provocada pelas expectativas a respeito de uma operação legal com banqueiros ingleses da Morton & Rose, causou uma liquidação forçada dos títulos.
Houve quebra de confiança e pânico no mercado de títulos. O governo tentou frear a especulação em torno deles, resultando em uma greve de três dias dos corretores da Bolsa de Valores contra uma cobrança da taxa de 3% sobre o valor das ações
Todo o mundo começou a vender seus papeis por causa dessa cobrança, ninguém queria amargar esse tipo de prejuízo. Mas apenas os títulos do Banco do Brasil, Banco Rural, Banco Comercial, Banco do Comércio, Banco de Depósitos e Descontos, Companhias São Cristóvão e Jardim Botânico obtiveram compradores.
Foi nesse contexto que terminou a gestão de Ruy Barbosa, que foi, então, cuidar de empresas que foram criadas durante a Crise do Encilhamento. Coincidência?
Logo depois, Deodoro da Fonseca era substituído por Floriano Peixoto.