Nem todos que operam hoje na bolsa de valores se lembram de como era o pregão viva-voz.
Nem parece, mas já faz dez anos que os pregões viva voz da bolsa de valores brasileira acabaram. Muitos não têm noção alguma de como era o pregão viva-voz.
Primeiro foi a Bovespa, em 2005: a bolsa de valores ficou totalmente eletrônica. Não tinha mais gritaria.
Depois, foi a Bolsa de Mercadorias e Futuros, em 2009, já depois de fundida com a Bovespa, formando a BM&FBovespa.
O fato é que aquele “inferno de Dante” com operadores berrando e fazendo gestos uns para os outros, segurando e preenchendo aqueles papeis, as boletas, comprando e vendendo ativos em grande quantidade, ainda está no imaginário das pessoas.
Hoje, isso não existe mais: enquanto o melhor dos operadores fazia algumas centenas de negócios por hora, os algoritmos automatizados de hoje em dia, posicionam e reposicionam ordens de compra e venda várias vezes por segundo.
Mas como era o pregão viva-voz? Como eles se entendiam?
Vamos tentar descrever.
A bolsa de valores pré-2005 tinha dois espaços com três computadores cada para consulta dos operadores de chão que precisassem de alguma informação extra.
Os operadores trabalhavam em “rodas”. Em cada “roda” um ativo era negociado. Tinha roda de Vale, roda de Petrobras e roda das principais ações que fossem mais negociadas. Quanto mais liquidez tivesse uma ação, mais popular era a “roda”.
Não era incomum que um operador com mais ordens – por exemplo, querendo comprar milhares de ativos – ficasse cercado por dezenas de outros que precisavam vender.
Tão logo dois operadores fechassem negócio – um comprando e um vendendo – levavam suas boletas para o balcão, onde o negócio era registrado, atualizando o sistema eletrônico.
Esse trabalho poderia ser feito pelos auxiliares, reconhecíveis por seus jalecos laranja. Esses caras faziam o trabalho braçal da bolsa de valores, do preenchimento das boletas a buscar informações nos terminais ou levar informações para alguém que precisasse enquanto o operador fazia o seu trabalho. Havia outras cores de jaleco que ajudavam a identificar as diferentes funções do pit.
Muito da comunicação era feita por gestos que poderiam significar “compro”, “vendo”, “fechado”. O fato é que era obrigatório dizer em voz alta, de maneira que todos pudessem ouvir, se se estava vendendo e comprando um ativo e em que quantidade, de modo que a outra parte interessada – a da compra e a da venda, respectivamente – pudessem dizer “Fechado!”.
Além de gestos, termos simplificavam a pronúncia de números: bola-bola é o valor redondo, como R$ 5,00 (os dois zeros são o bola-bola), galo é 50, quilo é mil e assim por diante.
Você ia ver os operadores com o telefone na orelha o tempo inteiro. Eles estavam recebendo as ordens das corretoras e precisavam reproduzi-las imediatamente a fim de fechar negócios.
No meio daquilo tudo, tinha um púlpito onde ficava o diretor do pregão. Ele dava início e dava o encerramento da “festa” dali. Mas geralmente só voltava a esse posto se algo importante ou fora do comum estivesse acontecendo.
Havia um “camarote” em torno do pit. Por ser protegido por vidro, era chamado de “aquário”. Ali, era um espaço de livre circulação de onde o público interessado poderia assistir ao pregão. Era comum que investidores mais envolvidos ficassem ali para dar suas ordens mais de perto, acompanhando a situação das ações e demais ativos a partir de terminais.
Provavelmente, seria o lugar de onde poderíamos assistir todo o desenrolar dos negócios. Hoje temos que nos contentar, porém, com o silêncio dos gráficos na tela de nosso computador. Tem suas vantagens, mas não dá para evitar de, de vez em quando, ficar com uma certa nostalgia.
Osney ou Sato, vocês guardaram alguma boleta em papel daquela época? Uma vez vi pra vender no Mercado Livre mas não sei se eram originais ou réplicas.